Tiese Teixeira Júnior
É sempre um grande prazer compartilhar com vocês leitores do blog, obras literárias de nossos mojuenses. Desta vez mais um livro do nosso professor Tiese Teixeira, que muito nos tem orgulhado com seu trabalho incansável na escrita, sempre com o pensamento voltado à escola, ao aluno. Vemos nele uma grande responsabilidade enquanto educador, que se esmera em buscar conhecimento a fim de que possa dar o seu melhor para a educação. Obrigado por mais esta obra professor Tiese.
Consubstanciado nos costumes, na cultura e nas narrativas populares, No Tipiti, Na Peneira, a mais nova obra do professor Tiese Teixeira Júnior, nos presenteia com o seu olhar mestiço e nativo, ambientado no seu típico espaço: o interior, a roça, o rio. O aspecto físico, as formas de trabalho e o temperamento pacífico, herdados dessa miscigenação, caracterizam os personagens das narrativas, que emergem do seio de um povo, cuja cultura é exposta na forma do olhar, do saber, do sentir e do cultivar [...]
Esta é uma obra genuinamente cabocla. Nas entrelinhas de suas páginas estão às experiências de um povo que, apesar da modernidade, ainda mantém laços de intimidade e respeito à natureza, aos costumes e tradições que, aliados aos mais variados sabores da culinária paraense, ganham o mundo nas mãos de chefes, cujos primeiros professores são, sem sombra de dúvida, o povo das roças, unânimes em tradicionalizar e materializar as deliciosas iguarias na gastronomia paraense.
Leia também a resenha do professor de Literatura Jefferson César clicando aqui.
Acesse e adquira seu exemplar e se delicie com suas histórias.
Um texto como aperitivo a vocês.
SABERES
Sempre que penso em gente trabalhando naquele mundo, vejo mulheres, em primeiro plano. Vejo a Maria do Germano. Tinha esse nome porque era casada com um senhor, chamado Germano. Devia ter uns 55 anos. Estatura mediana. Largo sorriso e um bom humor inesquecível. Mexia a farinha no forno com uma habilidade, que dava gosto ficar olhando. Aquele trabalho exigia força física e habilidade na condução do rodo, que criava os movimentos de levar e trazer a farinho no interior do forno, num processo que começava lento, na fase de escaldar a massa, e aos poucos, ia ficando apressado, pois, do contrário, a farinha poderia queimar. Aos meus olhos, o movimento de puxar era sempre mais intenso que de empurrar a farinha de volta. Às vezes, ela criava verdadeiras acrobacias jogando porções de farinha pra cima, como num gesto de exibição de suas habilidades naquele trabalho. Ora os braços estavam levantados acima da cabeça, ora na altura da cintura. Não paravam. Era como uma dança. Um saber fazer importante naquele mundo. Nada disso excluía a enorme força física empregada naquela tarefa. Trabalho pesado e feito por mulher. Trabalho que alimentava vidas. Era como a Naza, quando fazia paçoca de gergelim. Às vezes, movimenta-se rapidamente em batidas ininterruptas, noutras, batia compassado, talvez como forma de descansar da lida. Em casa tinham dois pilões. Um ficava de pé, o que obrigava a gente ficar, também, de pé para socar a paçoca, e um que ficava deitado, em que era possível fazer o trabalho sentado. Eu, claro, quando me atrevia a socar milho pra dar comida aos pintos, usava a segunda opção. Mas, a Naza sempre usava o grande que ficava de pé. Tinham duas mãos de pilão também. No pilão pilava-se arroz, milho, café torrado, maniva pra fazer maniçoba e paçoca de gergelim, que pra tomar com café era ótimo. A mistura era: Gergelim torrado, açúcar, farinha e força nos braços. A paçoca era guardada numa lata, pra se manter torrada. Ficava numa prateleira baixa, e ao lado tinha sempre uma colher, então, era comum vez por outra durante o dia, alguém dar uma paradinha e colocar uma colher de paçoca na boca e seguir seu rumo, ou ir até o pote, que ficava no outro canto da cozinha, tomar um caneco de água, pra descer o alimento e depois seguir pra seus afazeres. Logo a lata ficava vazia e era comum um faminto desavisado reclamar que não tinha mais paçoca. Não me lembro de ver a Naza comendo aquele alimento que ela fazia com tanto esmero. Alias, só lembro da Naza trabalhando. Parecia que ela estava sempre procurando algo pra fazer. O trabalho dela era um dos que mais movia aquele mundo. Eu gostava, também, de quebra queixo, hummm... feito de gergelim torrado com açúcar, levado ao fogo até o açúcar caramelar em uma panela de barro. Depois era colocado numa folha de bananeira, pra esfriar e endurecer. Acho que o nome se devia ao fato de ser tão duro, que quase quebrava os dentes na hora da mordida. Eu acompanhava todo o processo, sempre apressado e tagarelando. Quem comia primeiro era eu. Ser o filho caçula tinha lá suas vantagens.
TIESE TEIXEIRA JR
Do livro NO TIPITI, NA PENEIRA
Texto extraído do site da Editora DTX
Leia também a resenha do professor de Literatura Jefferson César clicando aqui.
Acesse e adquira seu exemplar e se delicie com suas histórias.
Um texto como aperitivo a vocês.
SABERES
Sempre que penso em gente trabalhando naquele mundo, vejo mulheres, em primeiro plano. Vejo a Maria do Germano. Tinha esse nome porque era casada com um senhor, chamado Germano. Devia ter uns 55 anos. Estatura mediana. Largo sorriso e um bom humor inesquecível. Mexia a farinha no forno com uma habilidade, que dava gosto ficar olhando. Aquele trabalho exigia força física e habilidade na condução do rodo, que criava os movimentos de levar e trazer a farinho no interior do forno, num processo que começava lento, na fase de escaldar a massa, e aos poucos, ia ficando apressado, pois, do contrário, a farinha poderia queimar. Aos meus olhos, o movimento de puxar era sempre mais intenso que de empurrar a farinha de volta. Às vezes, ela criava verdadeiras acrobacias jogando porções de farinha pra cima, como num gesto de exibição de suas habilidades naquele trabalho. Ora os braços estavam levantados acima da cabeça, ora na altura da cintura. Não paravam. Era como uma dança. Um saber fazer importante naquele mundo. Nada disso excluía a enorme força física empregada naquela tarefa. Trabalho pesado e feito por mulher. Trabalho que alimentava vidas. Era como a Naza, quando fazia paçoca de gergelim. Às vezes, movimenta-se rapidamente em batidas ininterruptas, noutras, batia compassado, talvez como forma de descansar da lida. Em casa tinham dois pilões. Um ficava de pé, o que obrigava a gente ficar, também, de pé para socar a paçoca, e um que ficava deitado, em que era possível fazer o trabalho sentado. Eu, claro, quando me atrevia a socar milho pra dar comida aos pintos, usava a segunda opção. Mas, a Naza sempre usava o grande que ficava de pé. Tinham duas mãos de pilão também. No pilão pilava-se arroz, milho, café torrado, maniva pra fazer maniçoba e paçoca de gergelim, que pra tomar com café era ótimo. A mistura era: Gergelim torrado, açúcar, farinha e força nos braços. A paçoca era guardada numa lata, pra se manter torrada. Ficava numa prateleira baixa, e ao lado tinha sempre uma colher, então, era comum vez por outra durante o dia, alguém dar uma paradinha e colocar uma colher de paçoca na boca e seguir seu rumo, ou ir até o pote, que ficava no outro canto da cozinha, tomar um caneco de água, pra descer o alimento e depois seguir pra seus afazeres. Logo a lata ficava vazia e era comum um faminto desavisado reclamar que não tinha mais paçoca. Não me lembro de ver a Naza comendo aquele alimento que ela fazia com tanto esmero. Alias, só lembro da Naza trabalhando. Parecia que ela estava sempre procurando algo pra fazer. O trabalho dela era um dos que mais movia aquele mundo. Eu gostava, também, de quebra queixo, hummm... feito de gergelim torrado com açúcar, levado ao fogo até o açúcar caramelar em uma panela de barro. Depois era colocado numa folha de bananeira, pra esfriar e endurecer. Acho que o nome se devia ao fato de ser tão duro, que quase quebrava os dentes na hora da mordida. Eu acompanhava todo o processo, sempre apressado e tagarelando. Quem comia primeiro era eu. Ser o filho caçula tinha lá suas vantagens.
TIESE TEIXEIRA JR
Do livro NO TIPITI, NA PENEIRA
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